Wednesday, May 26, 2004

parado atrás da sombra, ele ria. um olho mais escuro era medo da porta no chão do quarto. haha. você que me chama e não vem, seu colchão ortopédico falso e sua desculpa de verificação de matemática, hein?

três
polegares
acima,
uma velha gorda e suada [muito parecida com o rosto naquele quadro antigo] tocava a ponta do seu nariz.

-aceita um chá, leopoldo?

soprou a porcelana * * * * * * antes do primeiro gole.
tubarão branco na parte mais rasa da praia a gente mata assim, com faca de barbatana.

-não tenha pressa, meu anjo. é uma camisola nova e macia.

a pele da velha era lisa e seu rosto dizia uns trinta anos para trás da certidão de nascimento. o chá, adoçado com areia.

-entre no táxi, leopoldo. leve a valise com você. não esqueça de perguntar sobre o resultado da verificação. vamos, entre no táxi!

txtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxtxt e a sombra abriu até a colherinha de prata com inscrição da compahia aérea - aquela das promoções. no talher, um talho do olho da velha vestida na camisola, aos dezesseis anos, cercada de papéis de rascunho. pelo retrovisor, leopoldo vê o rosto da velha misturar-se ao seu, são a mesma pessoa:

uma ginasial nervosa com o cinema marcado no shopping. ele tinha cabelo castanho e ela, um perfume doce. era um desenho animado com homens das cavernas. comeram sanduíche com gosto de fábrica e ela trocou as sandálias para não ficar maior do que o muro.

um arrepio no sofá
recado perdido,
braço quebrado.

"vou fazer vestibular para medicina!!!" [mr.dr.mr.dr.mr.dr.]
"cobaia da baba verde, rasgue essa carta! Deixe que eu raspo a cabeça." [tr tr tr tr tr tr tr trá tr tr tr]

- senhor leopoldo, são quinze reais.

o motorista do táxi, um senhor de três metros e oitenta, crucifixo no punho e um cheiro de cachimbo, esperava o dinheiro. no bolso, uma chave com as letras do nome dela, a inglesinha [ou era um sorriso?]. mas nenhum centavo.

-senhor, não tenho todo tempo.

e nada, nenhuma moeda. ia propor uma troca, talvez aquele livro, talvez a porcelana do chá, uma xícara de areia molhada.
é quando o dono do carro esbugalha os olhos, abre a porta e indica a saída. o carro que vem atrás passa voando na poça de lama e leopoldo está perdido. são quinza para as cinco de uma rua deserta.


acordo com a chuva no rosto

Tuesday, May 18, 2004

você é uma calçada na beira de todos os bustos incompreensíveis, cantando que ela está deixando sua casa depois de morar sozinha por tantos anos. uma sequência de letras que masco sem pressa no fim da minha madrugada. já reparou, lang, a sinestesia de uma terça-feira, às cinco e trinta e oito? ela fica púrpura e branca e morna e calma.
e eu aceitaria agora um dos seus cigarros para assistir deus sendo colocado no seu devido lugar...

Monday, May 17, 2004

ALCATRÃO

eu matei Deus esta noite. fui até o posto de gasolina, carreguei minhas moedas,
descarreguei minhas mágoas e comprei um maço de marlboro light. traguei profundamente.
o mundo começou a fazer mais sentido. sucumbi e quis criar alguma coisa. e li você

al nite lang
1TON

inferno astral. segundamina. feiranfeta. porque sempre e sempre e o ciclo altera o ritmo do que vem atrás. as tropas na retaguarda, tremidinha absurda e não dá pra falar nada, antes que pareça estranho. e é mesmo. e que a fumaça só volte quando não fizer barulho dentro da cabeça, quando tudo puder ficar calmo e o dominó não derrubar o resto das idéias de fila indiana.

e esse quartinho vertiginoso de manhã. o ponteiro finge que vai bater no doze e uma música transparente chega por dois canais. o amor cor-de-rosa vai dar uma volta no inferno [país dos quadrados]
e volta com o cérebro quarenta vezes maior do que o músculo involuntário.

não demorou quase nada, o tempo de um pesadelo, desses de acordar babando. e agora eu lembro, agora eu fico nessa de arquivo para o insconsciente. está no oito ainda. dá pra costurar um pouco de vapor entre uma e outra. o olho fora de órbita, esses endereços fofos, fofíssimos, onde eles moram.

porquinho prático é o caralho.

o postal parisiense ampliado nas crateras da lua, com a flor, o jarro, os defeitos e os sonhos e os cabelos do sovaco. agora vem a rataguarda de calendário, quão estável pode ficar isso de gostar e sair gostando e depois deixar pra lá, e voltar para abrir o baú. no tempo do ronca as pessoas tinham mais estabilidade, sabia?

e quanto mais parece que a vontade vem, quem diria que um gole daria nisso?! mas foi a mistura, foi a mistura entendeu? não foi só um gole, nem descer as escadas vendo espectro volátil, nem ficar fingindo que não tinha nada depois, nem pedir para ficar, nem nada.

é só dar ao alívio um vestido mais folgadinho... que você há de convir, mademoiselle, que ele não veste calça jeans de cintura baixa, nem usa cueca, nem sinto, nem passa brilhantina no cabelo.
agora, a seta quase no onze! sai do cronômetro, entra na sacanagem, afrouxa mais ainda o laço e ele vai, pega aqui, aqui e aqui, a tônica do baque, tremida de oração:

deus, pai do trovão, das ondas havaianas, das pirâmides, dos perfumes de borrifar, dos beijos de língua, das línguas enroscadas nos buracos secretos do corpo. guardião das nuvens preparadas para jogar chuva no chão, dos grãos de areia espalhados com o vento, das copas mais altas da floresta e das raízes parrudas da cidade...

deus da cera, da vela, da foice, da tela, da língua ferina, do senso eletrônico, da guerra, das fotografias amareladas, dos peixes abissais, dos aeroportos internacionais, das filhinhas dos catadores de lata, dos chefes, dos reflexos da lua em cavernas azuis...

pai das veias inchadas de exames mal feitos, de engarrafamentos, de festas e manicômios e bolas e efeitos colaterais, do perído fértil...

filho da deusa da terra das brumas, da ilha escondida atrás do fim do mundo, dos celtas, dos loucos, dos velhos, dos sujos, dos matadores, coveiros, políticos, chefes de estado, revisores de texto, atores de teatro, mímicos e ilustradores...

preservai a libido em potência, aquecei o olhar quando murcho, não deixai que eu sente para esperar o futuro, por mais que haja pólen. dai-me mais saliva e que eu não a gaste em verbo. amplificai o frêmito, reverberai a tremida e que essa zuada, senhor deus, deus de deuses, que essa zuada [de três olhos, uma perna manca e todos os dentes caninos] vibre por uma semana.

"a revolução não vai passar na tv" mesmo, nem comam essa pilha. macaco esperto, amiguinhos, conhece o galho onde enrola o rabo.



Tuesday, May 04, 2004

DOROTHY

sapatos que insistem em fazer bolhas
calos nas laterais
fivelas de navalha.

veias azuis para fora do número
trinta e cinco
cãimbra e o sangue magoado
outra vez em cima
da marca do pé
apertado contra o couro falso.
vamos andando
e nancy sinatra mil vezes
até eles chegarem
até eles pararem de mexer.
>>>>>>

o grito de nancy: "these boots are made for walking, and that's just what they'll do".

Quem?

Diário de uma membrana. Especulações sobre surtos homeopáticos.